
"De repente, senti o meu corpo como uma massa imensa, inquebrável. E nos meus ouvidos, a Piaf sussurrava qualquer coisa que não consegui entender. (…) Trouxeram-me o casaco que não vesti, quase não conseguia mexer-me. Depois, fui para o carro; fiz a viagem num estado de alerta sensorial, como se os ruídos me tocassem. Em casa, veio o banho, e foi como se tivesse saído novamente do útero da minha mãe". "Dissertação Sobre a Vaidade", performance, dia 3 de Dezembro de 2006
segunda-feira, 29 de dezembro de 2008
sábado, 27 de dezembro de 2008
Sísifo

Quebro-me ao mascarar todo o meu desassossego que quase rebenta com a cabeça em partes infindáveis de partículas ínfimas deste mal-estar físico que quer-me tentar dizer “saí saí saí!” mil vezes “SAÍ!”. Mas eu sei. E calo. E passos os dias do Dia em ausência só para tentar suster as náuseas, as dores, as lágrimas, as mudanças, as tonturas, a imobilidade, a agorafobia tortuosa, o medo de perder o controlo das minhas faculdades. O pânico…
Não desejo mais inquietações por favor, suplico a alguém, algo, suplico ao Nada que me deixe entrar em si, na sua redoma de vidro em brasa onde tudo fica em suspenso para não se lacerar ----------------------------- assim, como uma placenta cheia de quimeras ou uma existência alternativa em que tudo está perfeito, onde… Era uma vez e viveram felizes para sempre, como numas folhas perdidas em que desenhava quando não sabia escrever. E quanto mais revivo menos vivo, e quando vivo experimento a aflição de ser um vislumbre.
Andar – parar – sentar – executar – levantar – andar – subir – andar – executar – sentar – andar – parar – sentar – executar – levantar – andar – subir – andar – executar – sentar andar – parar – sentar – executar – levantar – andar – subir – andar – executar – sentar quantas vezes fores precisas, andar – parar – sentar – executar – levantar – andar – subir – andar – executar – sentar e tentar não pensar, andar – parar – sentar – executar – levantar – andar – subir – andar – executar – sentar e fitar o número Vinte e Dois com os olhos muito abertos como se fosse uma criança que de repente se vê mulher e não se tinha apercebido. “Saí!” manda a voz na minha cabeça – mas tenho se ser mais forte que o impulso e ficar, o tempo não se esgota assim, ainda ontem era 2003 e tinha o mundo a meus pés, agora apenas cinco anos depois e carrego-o ás costas.
quarta-feira, 24 de dezembro de 2008
sexta-feira, 19 de dezembro de 2008
Descargo de consciência...
...podem causar dano ao seu cérebro?
As células do cérebro trabalham juntas e se comunicam por meio de sinais elétricos. Às vezes, há uma descarga elétrica anormal em um grupo de células nervosas e elas enviam sinais incorretos a outras células ou ao restante do corpo, iniciando os "ataques" ou crises. Cada pessoa tem um limiar convulsivo que a faz mais ou menos resistente a excessivas descargas elétricas no cérebro; por isso, qualquer um pode ter uma crise sob determinadas circunstâncias. Os tipos de crises epilépticas dependem da parte do cérebro onde começam essas descargas anormais. Se as crises duram muito tempo, a epilepsia pode causar danos ao cérebro. Porém, a maioria das crises não provoca dano algum.
...podem levar um portador de epilepsia à morte?
A morte, em virtude de ataque epilético é difícil de ocorrer. O risco é maior quando a pessoa tem um ataque que se prolonga por 30 minutos ou mais, sem recuperar a consciência (estado de mal epiléptico). Neste caso, ela deverá ser conduzida a um serviço de pronto atendimento.
Sentimento Esquisito
Morreu sozinho. Com um ataque epiléptico.
Banner novo
Acertou em cheio. Obrigada*
quarta-feira, 17 de dezembro de 2008
Sr. Henrique
Esta introdução toda para falar do Sr. Henrique. Teve um traumatismo craniano porque ia de bicicleta quando uma carrinha lhe bateu. Levou com um o espelho e depois bateu fortemente contra o alcatrão.
Ele trabalhava na Marinha (acho eu), e fazia de tudo. A minha terapeuta ocupacional conhece-o, pois são da mesma terra. Ora tenta imaginar um senhor com 60 anos, com filhos e netos, dizem com grande sentido de humor. Calvo, não muito gordo, com um ar malandreco, de repente vê-se atirado para uma cadeira de rodas, preso com lenços e com um tabuleiro amarrado à cadeira para não cair ou sair da cadeira, coisa que já fez. A primeira vez que o ouvi ele estava a falar normalmente e (é isto que não esqueço), põe-se a atirar beijos para o ar. Parece que ele está cá, mas está num mundo completamente à parte, começa a falar (e o que diz tem sentido) e, de um momento para o outro, parece que imagina situações ou pessoas. Fisicamente não tem (à vista desarmada) nenhum problema. Mas nota-se que está perdido numa massa cinzenta que não regenera. Manda só as informações para outro lado. Mas nunca se sabe se alguma fica pelo caminho.
Nunca se sabe nada.
sábado, 13 de dezembro de 2008
terça-feira, 9 de dezembro de 2008
quinta-feira, 4 de dezembro de 2008
Mais uma “ite” e uma sorte do caralho…
Acordei ás 6h da manhã na terça completamente nauseada. Ás 7 e picos estava a vomitar os cogumelos do jantar. Tinha de comer porque tinha de tomar os comprimidos. E comi. E tomei. Uma hora depois estava a vomitar tudo: chá de camomila e uma bolacha e meia “Maria” que roubei à minha parceira de casa.
Hospital. Naquele mesmo hospital onde me lembro de ter vomitado antes ter apagado 12 dias. Urgências e tudo o mais. Comecei a ter arrepios na espinha, pedi para me ir embora. “Só quando o soro acabar”. Então, se posso sair quando o soro acabar, meti aquilo a escorrer que nem água. Dor por dor, antes aquela do que a da paranóia.
Diagnostico, gastroenterite.
sábado, 22 de novembro de 2008
O meu amigo Zé
"Ah, todo eu anseio por (...) aqueles momentos em que não tive importância nenhuma, aqueles em que compreendi todo o vácuo da existência sem inteligência para o compreender! E havia luar e mar e a solidão, ó Álvaro...” (não gosto da pontuação do Fernandito mas, bom, o que interessa – para além do meu mau feitio – é que este excerto me faz cada vez mais sentido… Ou outro sentido. O Mário Cesariny tinha mais mau feitio “O Álvaro gosta muito de levar no cu”, dizia. Vou deixar os julgamentos ao vosso critério… Mas devo dizer… O Mário rula!!)
2ª fui a Lisboa ver o médico que me acompanha desde os 18. Encheu-me de esperança e optimismo, estivemos pouco mais de uma hora a falar. Mais força para continuar, estava a precisar de uma maneira brutal. Claro que sempre que venho para a Marinha ficou um pedacinho mais em baixo, mas… C’est la vie. Continuo com mil coisas que gostaria de fazer AGORA, mas começo a compreender cada vez mais o DEPOIS, o não imediato. Não quer dizer que isso seja menos doloroso. Continuo a desejar que a recuperação se faça depressa… A minha mãe no outro dia disse-me na brincadeira “entretanto fazes 23”, e o mundo parou na minha cara; VINTE E TRÊS??? Sinto-me uma velha com corpo de adolescente. E já reparei que ando um bocado ás aranhas com a minha identidade; não sou bem aquilo que era, mas também não sei bem o que sou, parece mesmo que estou numa espécie de segunda adolescência.
“Menos uma semana”, dou por mim a pensar naquela meta imprecisa, de “quando estiver bem…”, mas não sei o que é o “bem”, “bem” para trabalhar? “Bem” para conduzir? Ou um “bem” que não faz qualquer sentido quando se sobrevive a uma doença tão má e em que temos de estar gratos por estarmos vivos?
Tenho a doença de querer sempre mais e mais e mais, e a meta de ontem já foi ultrapassada. E se a de hoje não for, amanha será. Esperança e obstinação e… Paciência, sobretudo. O que falha ás vezes, naqueles momentos de puro descontrolo. O meu médico/ amigo/ confidente/ feiticeiro Zé apaziguo-me dizendo que é legitimo o que sinto. Foi a primeira vez que ouvi isso, e tirou-me um peso de cima. Tenho o direito a fraquejar, finalmente deixei de me sentir culpada por ás vezes não aguentar.
Amanhã há-de ser um novo dia. E se não for um dia bom, o outro será. Até à tal meta. A meta em que me vou sentir verdadeiramente feliz, demore o tempo que demorar.
Foto do Gustavo
ESAD d'um caralho...
Parece que se esqueceram dos primeiros dois anos de teatro que houve naquela escola... Tudo bem, não tinhamos nada, luzes e fotografos e mais aquele material todo (marketing)... Mas porra... Também andamos lá...
terça-feira, 18 de novembro de 2008
Sinusite, faringite, e outras coisas acabadas em "ite..."..

Diagnostico:
Faringinte
Sinusite
Sintomas:
Aftas na garganta
Dores de cabeça e no maxilar
Espirros, tosse e olheiras
Ar remeloso
P.S.: Quando se pensa que as dores, as dormências, os ataques de pânico, os traumas etc, etc, não são suficientes, eis que surge sempre outra coisa para nos foder a cabeça. Bom, "Aguenta e Trabalha" (Jonix, podia ser o teu slogan... Mas parece um bocado Estalinista :D)
domingo, 16 de novembro de 2008
Isto agora é privado...
Resumindo, houve um “tu” que se sentiu no direito de me roubar a minha privacidade. Tenho mesmo muita pena que assim tenha acontecido. As pessoas julgam que ganhei alguma espécie de super-poder ou uma mega capacidade de compreender o ser humano. Pois então, quanto mais conheço, menos compreendo. As pessoas perderam a capacidade de comunicar, de dizer as coisas que lhe vai na alma.
Tenho muita pena, mesmo muita pena. Os outros leitores não mereciam isto.
domingo, 9 de novembro de 2008
Desafio Aceite
1. publicar uma foto pessoal

2. escolher uma banda ou um cantor
Er… a primeira coisa que me meti a ouvir foi Mão Morta (dispenso graçolas porque eu já as fiz, eheheh)
3. responder a algumas perguntas com títulos de músicas ou nomes de cantores e/ou bandas (assumo que não tenho necessariamente que gostar das músicas):
a. és homem ou mulher?
Menina Moça - Martinho da Vila
b. descreve-te.
Eu nao sei o que quero – Garotos Podres
c. o que as pessoas acham de ti?
O Herói – Mão Morta
d. como descreves o teu último relacionamento.
Amor de loca juventud – Buena Vista Social Club
e. descreve o estado actual da tua relação com o teu namorado/companheiro ou parceiro ou whatever.
Extraordinary – Jill Tracy
f. onde querias estar agora?
Warsaw – Joy Division
g. o que pensas a respeito do amor?
Não sei falar de amor - Deolinda
i. o que pedirias se pudesses ter só um desejo?
All Of Me – Billie Holiday
4. Por fim cabe-me desafiar quatro pessoas:
Ri
Nuno
João
Marciano
O Rei Mimado (Mão Morta)
Os meus cordões seguram-me à sanidade por meio de comprimidos amarelos pequenos que se põem na boca e sabem a papel.
segunda-feira, 3 de novembro de 2008
Re-Cobro Re-Volta
Eu, Daniela Maria Morganiça dos Reis, 22 anos, natural da freguesia da Marinha Grande, a viver actualmente nas Caldas da Rainha, começo a duvidar da minha integridade mental após quase 15 meses de ter sofrido um AVC hemorrágico devido a uma malformação congénita. Admito-o sem qualquer problema. Quem és para me julgar? Sinto-me revoltada com o destino ou coincidências, deus ou azar, a minha insurreição tem um só rosto:

O rosto de quem se queimou na alcatifa do quarto depois de ter acordado a ter um ataque epiléptico e se levantou com a cabeça a incendiar-se de mil fragmentos de imagens, palavras, sons. Estava tão perdida que comecei a beber água sem motivo, e foi aí que me sentei e caí redonda no chão, mesmo de cabeça, e o meu ultimo pensamento – e isto é mesmo verdade – foi: “estou fodida.”
Minutos depois levantei-me inconsciente e fui à casa-de-banho. Não conseguia andar e o meu namorado levou-me. Voltei para o quarto e “adormeci”, só para acordar minutos depois, consciente, sem saber onde estava e o que o meu namorado fazia ali.
Depois, bola de neve, medo, medo, medo, medo até de sair à rua, medo de sair da cama.
É agora. Hoje anuncio a minha mediocridade perante ti que me lês, e anuncio também (caso ainda não tenhas reparado…) este aspecto masoquista que tenho de escrever toda a merda que me acontece, portanto isso faz de ti um sádico.
terça-feira, 21 de outubro de 2008
sábado, 18 de outubro de 2008
Em relação ao “nojo”
Eu não tenho a sensação de “nojo” no meu lado direito. Lembrei-me disto porque a minha irmã tem a mania de lamber a mão e passar no meu braço ou assim. Hoje disse-lhe, para pena dela, que não adianta. A única coisa que sinto é o quente da saliva, mas podia ser água quente, ou um objecto quente qualquer (como uma botija de agua quente).
Parece-me que o “nojo” é essencialmente táctil e consequentemente visual. Por exemplo, uma pessoa dita “normal” se sentir algo molhado e não sabe o que é, não sente nojo. Mas se olhar e se aperceber que era uma escarra verde até fica doente. Claro que há situações em que a pessoa sabe logo no que tocou. Bom, eu nunca sei no que toco a menos que veja.
Eheheheh
sexta-feira, 17 de outubro de 2008
Lord of the flies 1963 - First meeting
"Lord of the Flies", de Peter Brook (1963).
(I'm back to "shcool" eheh.)
quinta-feira, 16 de outubro de 2008
Mestrado
Um dos professores que encontrei foi o professo de corpo. Percebi logo que ele estava surpreso de me ver ali, alias, a ultima vez que me viu foi pouco tempo antes do AVC. Ele chegou-se ao pé de mim, deu-me um abraço enorme e disse “Estás viva!!”. Sim, estou viva, vivinha da silva, em preparação para a vida, com muita mais vontade de viver, com muita mais tesão para fazer coisas. Claro que me canso mais depressa, claro que sei que não sei como vou ficar. Não interessa. Estou aqui, porra, e é para aproveitar cada segundo. Agora é que entendo porque é que a minha antiga terapeuta ocupacional, a Alice, diz sempre “tens que te desligar da terapia e fazeres a tua vida”. Claro que ela não se estava a referir a uma desistência da própria terapia, mas para eu não viver “obcecada” com a terapia.
Mais tarde, eram 23h30, recebi um telefonema do Jonas “miúda, tenho uma boa notícia para ti. Vai haver mestrado na escola. Deve começar no 2º semestre”. Fiquei radiante. Claro que gostaria de tirar o mestrado noutro país, como sempre pensei que fosse fazer, mas uma pessoa tens que adaptar ás circunstâncias. Assim tenho terapia, e não estou parada, estou a aproveitar para fazer uma coisa importante. E depois, quando me sentir preparada, levanto asas e sigo os ventos do sul… Não me posso acobardar. Nunca. E conto contigo…
Coisas perdidas na memoria… I
Parece-me que já estabilizei os ataques epilépticos, desde que comecei a tomar mais meio zigabal. Ás vezes é tão fácil como isso, e não vivo alarmada sempre com medo de ter um a qualquer momento. Claro que não me apetecia muito encharcar-me de comprimidos de manha à noite. Bom, do mal o menos…
terça-feira, 14 de outubro de 2008
Nicki Jaine: You are my Sunshine
Interessado nesta voz? Aconcelho o album "Of Pigeons And Other Curiositi".
A miúda tem uma voz fantastica...
segunda-feira, 13 de outubro de 2008
Mártir, Heróina, qualidade "Mãe"
Tenho vindo a acompanhar os anos de trabalho ao jantar, quando ela conta o seu dia. E passou da excitação, das cusquise das colegas, para o total desespero. Sempre quis tira-la de lá. A minha mãe já não tem 40 anos. O corpo clama descanso. Os pulmões estão cheios de pó daquela merda de sítio que corrói os brônquios, que lhe come a agilidade, que lhe a faz ter vontade de arremessar as coisas contra a parede e dizer “BASTA!!! Eu sou um Ser Humano, não um animal!!”
Penso muitas vezes que se fosse rica que a primeira coisa que fazia era tira-la de lá. Tenho de ser forte por ela e por mim. Já teve a sua (enorme) dose de sofrimento.
“Estou cansada”, dizia eu. Agora é que me apercebo do quão estúpido foi o que disse.
Tenho medo que as pessoas que amo morram. Aprendi que a vida é um fôlego, e a morte custa mais a quem cá fica do que aos que partem. Insisto que ela tome conta de si, mas parece que ela se privou de tudo para a minha irmã e eu. Este aspecto mártir que ela sempre teve assusta-me…
domingo, 12 de outubro de 2008
NUNCA DESISTIR!!
"Uma noite diferente de todas as outras"
"Foi, sem dúvida, o momento mais emotivo da noite. Distinguido pela sua brilhante interpretação no espectáculo ‘Endgame’, de Samuel Beckett, numa encenação de Bruno Bravo, o actor conseguiu pôr o Coliseu em pé, ao recordar o acidente vascular cerebral (AVC) de que foi vítima em 1995 .
“Rebentou-me uma veia no cérebro e é por isso que tenho dificuldades de locomoção e não mexo o braço direito”, explicou. “Isto é só para aqueles de entre vós que ainda não tinham reparado”, rematou, com o sentido de humor que o caracteriza.
A gargalhada foi geral, mas muitos não conseguiram disfarçar a lágrima ao canto do olho, desarmados pela forma aberta como o actor partilhou com o público a experiência mais dramática da sua vida.
NUNCA DESISTIR
(...)Mas, em 1995, um AVC ameaçava pôr fim a tudo. Miguel Seabra passou muito tempo no Centro de Reabilitação do Alcoitão, e nunca mais esqueceu a lição do senhor que o ajudava a subir de elevador. “Ó rapaz , não deixes de fazer o que gostas. Podes não fazê-lo exactamente da mesma forma... mas fá-lo de uma maneira nova.”
sábado, 11 de outubro de 2008
Tu tens a palavra!!
(Private joke. Eu moro no Bairro de Casal de Malta na Marinha, conhecido pelo tráfico e prostituição, e quando eramos putos havia sempre um puto que dizia - antes de levar - "olha que eu sou do bairro e conheço o Totta!!". O Totta devia ter uns 14, 15 anos nessa altura e toda a gente tinha medo dele. Não sei o que é feito dele agora...)
Housewife
ESTA PARTE SE NÃO LERES POUPA-TE UMA SECA. ACREDIRA. Depois não digas que não te avisei…
Limpei a cozinha (o que inclui arrumar as coisas todas, limpar bancadas, lavar a louça, levar o lixo, ter dois dedos de conversa com as vizinhas – é o que digo, velhas e putos adoram-me, Freud explica…- limpar o microondas, varrer, lavar a mopa (se tu não souberes, Freud explica), passar o chão a pano. Depois foi a casa de banho, lavar as louças (sanita, lavatório…) tirar o lixo, varrer, passar o chão a pano. Depois foi o meu quarto, arrumar tudo, aspirar, por tapetes na janela, voltar a pôr tudo no sitio (do quarto, cozinha e casa de banho), acabar de arrumar as coisas que tinha de trazer para a Marinha e quando fui a ver eram 18h45. O comboio parte ás 18h58. E este não se atrasa.
Como tinha estado a arrumar desde as 16h sem parar até ás 18h45, estava cansada, suada, de mau humor e a pensar “ tenho 10min para me pôr na estação”. Nem pensei que se calhar não ia apanha-lo e era melhor ir de expresso, apesar de ser quase 3 VEZES MAIS CARO que o bilhete de comboio.
Ainda nessa manhã a minha fisioterapeuta me tinha dito que tinha de andar mais devagar. Pois. Da minha casa à estação normalmente são 15min de distância. Fiz o percurso em 8. Tirei o bilhete e sentei-me. O comboio estava cheio. Tinha o coração aos saltos, a face rubra, suava que nem um trolha, estava ofegante... Parecia que tinha estado a correr a maratona. Depois de andar quase 3h a arrumar, ter que fazer uma caminhada em marcha!... Bom sou uma deficiente muito eficiente, porra!
Cheguei a casa as 20h, e ás 21h30 já estava a dormir. Mas cometi um erro estúpido (mais uma vez, não é?), deixei os diazepam para tomar ás 23h (que é a hora regular em que os tomo). E, mais estúpido ainda, meti o relógio a despertar para essa hora. Acordei, tomei-os e estou aqui agora a escrever.
Ai ai, tenho que escrever coisas mais inteligentes (pseudo) neste blog. Não é isso que é suposto fazer?
Evil Night Together
Esta música é da Jill Tracy (album de '99), mas só consegui esta curta que não foi feita por ela. Mas está boazinha...
Enjoy!
quinta-feira, 9 de outubro de 2008
Um pequeno passo para a humanidade, mas um grande para mim!!
Terça-feira. Fui ao centro de emprego pela primeira vez. Uma confusão danada, mil senhas, até que encontrei a minha: “pessoas portadoras de deficiência e etc, etc…”. Eu sou portadora de deficiência, não é? Passei à frente de toda a gente. Afinal uma pessoa tem que aproveitar, tem coisas más, mas tem recompensa e faço tenções de as aproveitar todas.
Fui para um gabinete e nem sabia o que dizer. “Olá, quero arranjar emprego”. Expliquei que… Tu sabes, estou um pouco farta de explicar que tive um AVC. Ficamos a falar uma hora e meia. Uma mulher fantástica, orientou-me, aconselhou-me, falou comigo. Saí de lá com esperança. Vão meter-me numa coisa chamada “emprego protegido”, já que ainda estou em recuperação e não produzo como uma pessoa normal. Depende, de me meterem à frente de um computador é diferente, mas logo se vê. A doutora mandou-me ir lá hoje para falar com o responsável pelos empregos protegidos.
Então hoje foi um dia complicado. Comecei com as máquinas, não é fisio porque ainda estou em liste de espera, mas pedi para fazer máquinas (sinto falta, tenho o joelho bambo o que me faz não por o pé correctamente no chão). Estava a vir para casa (como sempre, a andar rápido. Acho que o facto de ter andado sempre atrasada me fez ganhar um trauma em andar devagar…) e torci o pé direito com tal violência que nem o conseguia por no chão. Atravessei a rua ao pé-coxinho para me sentar. Vinha um homem atrás de mim com uma miúda que devia ter uns 8 ou 9 anos e perguntou se eu estava bem. “Estou, isto já passa” disse, no meio de dores alucinantes. Se doeu brutalmente no direito, se tivesse sido no esquerdo… Até me dói só de pensar. O homem continuou o seu caminho e ia a dizer para a miúda “vês? É o que acontece ás pessoas que andam rápido!”. Mesmo com dores não consegui evitar um sorriso (meio tremido). Continuei o caminho muito devagar, sentia o pé a inchar. Cheguei a casa e deitei-me. Começou-me a doer o joelho, até mais que o pé. Pensei “estou f*dida” porque tinha que ir ao centro de emprego. O que vale é que apanhei boleia até lá. Falei com o psicólogo clínico que está responsável pelo o serviço, estivemos a falar um pouco e ele disse que me contactava para uma entrevista, para ver com os terapeutas o que era mais indicado para mim. Saí de lá com dores de cão, e fui comprar um joelho elástico e um pé elástico. Tive de correr meia Caldas para encontrar, e ainda tive que vir a pé para casa porque o TOMA (autocarro urbano) chega a todo o lado, mas nunca chega a horas. Fui a pé para casa (a minha impaciência ás vezes dói mais que outra coisa qualquer…). Cheguei a casa e meti logo tudo, e, apesar das dores, senti o pé mais apoiado. Agora tenho terapia na sexta e espero que as passem até lá.
terça-feira, 7 de outubro de 2008
Power Ball

3- Enfia-se o cordão num pequeno orifício.

4- O cordão vai acompanhando a bola e deixa-se uma ponta solta, mas só o suficiente para pegar nele e puxar de forma a que a bola (que é aquela coisa verde/ amarela que estás a ver) gire e obrigue a mão fazer movimentos circulares.

Bastam 5 minutos por dia. É bom, porque tenho o braço com um tonos diferente que o pulso, e sinto que o pulso não está a acompanhar a evolução do braço. Dou muitas vezes por mim com o pulso relaxado na marcha, e quando quero pegar em alguma coisa, a mão, para poder segurar, vai para dentro e apoia-se, encosta-se ao meu peito.
domingo, 5 de outubro de 2008
"Falhar, falhar mais vezes, falhar melhor!"
Quero viajar, correr a Europa de comboio. Antes o problema era o dinheiro. Agora, antes do dinheiro, vem a minha recuperação. Sempre quis dar uma volta pela Europa quando terminasse o curso, em vez disso tive uma volta ao meu cérebro e, consequentemente, à alma. Não me sinto lá muito realizada, e a única coisa que peço é um empregozito para juntar uns trocos para daqui a um tempo, seja quando for, retomar esse plano, nem que seja daqui a 10 anos. Mas saber que estou a fazer algo por mim levanta-me a auto-estima, faz-me sentir-me útil. Convidaram-me de novo para dar aulas nas Marinha, mas não posso, como é lógico. Começo a duvidar se a escolha que fiz foi a mais correcta… Porque tinha um plano, que era tirar o Mestrado, mesmo sabendo que não tinha a certeza se o Mestrado abria ou não. Arrisquei, e parece-me que não estou a petiscar... Calma, as coisas hão-de surgir, eu sei… Mas a calma esgota-se. Ou melhor, descarrega, como se fosse uma bateria, porque tenho sempre que a voltar a carregar. Ás vezes leio uma entrevista que o Miguel Seabra (actor e director do Teatro Meridional, que teve exactamente o mesmo problema que eu em ‘95 – ele tem 43, pelas minhas contas) deu a um site (http://www.c-e-m.org/reflexoes/014/4.htm) e fico sempre mais animada quando leio coisas dele. Ele dizia, numa das pesquises que fiz sobre dele: “Decidi que tinha que seguir em frente e sempre para cima! Ajudou-me sentir que tinha a confiança dos que estavam à minha volta para poder falhar e recomeçar. Lembrava-me sempre da frase de Samuel Beckett: “falhar, falhar mais vezes, falhar melhor!”” – roubei este excerto do site http://laurindaalves.blogs.sapo.pt/25322.html . Choro muitas vezes, mas aquela frase do Beckett viola-me porque já a tinha lido há tempos e não a compreendi. Agora evito ler Beckett porque me parece assustadoramente claro. É um grito (vejo assim, a minha interpretação pode não ser a mais correcta, mas que se foda) de aceitação e libertação do erro, porque afinal a perfeição é uma noção obtusa, eu falho, falho muito, falho demais, mas luto para caralho e aprendo a manipular os meus erros para me serem úteis. Porra. Já estou a chorar outra vez. Mas é bom explodir aqui, onde não me julgas. Mas é um choro de alívio, precedido de uma raiva imensa que cresce todos os dias e nem me apercebo porque estou mais ocupada a lutar. E quando paro, sai tudo. Alivio. Para retomar o combate comigo e sair vitoriosa. Outras vezes chegamos a um acordo, o que não é mau.
sexta-feira, 3 de outubro de 2008
quinta-feira, 2 de outubro de 2008
terça-feira, 30 de setembro de 2008
domingo, 21 de setembro de 2008
Há coisas bizarras...
Linda Martini - As putas dançam slows
Não encontrei a "Raposa Manhosa", que era o que estava a ouvir quando escrevi o último post... Mas também esta serviu de pando de fundo.
Reflexão #248
Hoje admito, acho que merecia passar por isto. E acho isto de uma forma egoísta, mas também não quero saber. Torna-se difícil ver sempre o lado positivo das coisas, por mais que queira. Sou mal interpretada pelo meu corpo, e vivo sempre atemorizada por ele. No fundo, continuo à espera de um milagre; acordar um dia e sentir que tudo acabou, que estou normal outra vez e poder fazer todas as coisas que evito pensar. Para não ficar ansiosa.
E os dias seguem-se e agora começo-me a aperceber que já passou muito tempo. As roupas que visto são as mesmas roupas que vestia no 2º, 3º ano do curso porque a única roupa que comprei eram fatos de treino para fazer terapia. Digo, às vezes na brincadeira, que comecei o 2º ano do curso de Reabilitação. Na verdade, é isso que penso; é certo que sou nova, mas comecei o 2º ano de terapia quando poderia fazer mil coisas para além deste monólogo interior que não cessa de me assustar. Chego muitas vezes a pensar que estou a enlouquecer. Por isso escrevo. Para exorcizar este horror que é ter um corpo que não controlo, e na esperança utópica de um resgate.
Estou em descrédito e enraivecida. Os sonhos, os meus sonhos não valeram de nada, o meu esforço, a minha fé nas coisas e no Mundo desvaneceu-se. Isto está-se a tornar muito doloroso…
domingo, 14 de setembro de 2008
# 100 (e um...)

Sugestão do rapaz de sempre... Gugu Tavinho!!!!!!! AHAHAHAHAH!!!
Pensamentos e factos aleatórios
Estarei deprimida ou apenas preguiçosa? Seja como for, esta inércia está-me a deixar doente, e aliado ao facto de passar muito tempo sozinha também não ajuda. Porque amo ficar em casa. Não me apetece sair, e passo dias em que só vejo o sol quando vou à terapia. Talvez esteja a fazer uma cura qualquer de combate à (compreensível) galinhice da minha família, ou seja preguiça pura e dura. O ócio pode ser bastante agradável quando não se espera nada.
Porra, como estou diferente.
Queria fazer coisas novas (compreende-se “coisas” por “coisas”) e não as coisas que tenho feito. Vai fazer 15 meses no dia 19. Antes (compreende-se “antes” por “antes do AVC”) fazia muitas coisas e estava insatisfeita. Agora (compreende-se “agora” por “agora que esta merda aconteceu”) não faço nada e (ás vezes) sinto-me satisfeita. Não me identifico mais com a vida que levava, isso é verdade, mas não quer dizer que não a recorde com saudade. Mas acho que se voltasse atrás não fazia metade das coisas que fiz. Fazia-as bem piores (ou melhores, ou whatever).
(Estou constantemente a tocar os “P’s” pelos “T’s” e os “F’s” pelos “V’s” quando escrevo. E quando estou muito cansada troco os “O’s” pelos “U’s”, o que me deixa muito embaraçada comigo mesma. Quando penso num número – um 8, por exemplo – digo 2, veementemente. Nunca acerto nos números quando os penso. O que vale é que com a escrita apercebo-me a tempo. Confesso que isso até me diverte…)
Pensei em terminar o blog quando o projecto Oportunidade do Espectador se realizou. Não tive coragem. Uma crise megalómana diria. É tão bom saber que nos lêem e que os leitores não fazem ideia do que estão a ler… (Alguma parecença com estar em palco?)
Se voltasse atrás e soubesse o que sei hoje, não tinha tirado curso nenhum. Não foram três anos perdidos, claro, mas tinha ganho mais se tivesse ido embora para o Mundo. Estou a pôr tudo em questão. De facto aprendi muito sobre mim, mas como costumo dizes “acho que teria aprendido num ano o que aprendi em três”. Não posso falar muito mal, porque o que aprendi ajuda-me na Terapia da Fala.
Noto uma certa impaciência com a impaciência dos outros. Quando vou pagar alguma coisa e demoro tempo (sim, tenho que usar as duas mãos…) e tenho pessoas atrás de mim fico impaciente e nervosa. O que me faz demorar mais. Então ás vezes, dou-me ao prazer de ser (só um bocado) cabra e de me deleitar fazendo as coisas com calma. O pior de se ser deficiente é ser deficiente e não parecer. Quando estás numa cadeira de rodas, toda a gente se compadece. Quando se parece normal as pessoas continuam a ser cabras umas para as outras. Não me queixo (muito).
Num dia desta semana vinha das compras e sorri para uma pessoa que julgava conhecer. Só quando me aproximei é que vi que não era e a mulher pôs-se a falar comigo sobre o pouco estacionamento e que estava à procura de lugar há meia hora. Contou-me a vida toda, e eu não parava de pensar “bom, ela está mesmo a precisar de reclamar” e ouvi-a. No fim ela soltou um suspiro. (Porque é que contei isto?)
Vou-te contar uma estória/ historia; um dia, uma menina com fogo no cú, ia numa descida. Essa menina era ligeiramente deficiente e estava ansiosa para chegar a casa, mas nessa descida ganhou alão e como o seu maravilhoso pé estava virado para dentro (o que acontecia quando a menina ficava muito cansada) e como tinha umas sandálias novas redondas à frente, literalmente tropeçou nesse pé e caiu brutalmente. A menina apanhou os quilos de comida que a sua mãezinha tinha feito, voltou-os a pôr no saco e só mais tarde se apercebeu que lhe doía a mão. Quando chegou a casa, enraivecida de frustração e dor, tirou uma foto para pôr no seu blog e chorou a noite toda até adormecer!
MORAL DA ESTÓRIA/ HISTORIA: Esta manteiga que estou a comer é uma merda.
segunda-feira, 8 de setembro de 2008
sexta-feira, 5 de setembro de 2008
Reflexão #247
Estou confusa porque ouço cada vez mais alto o grito de revolta que tento desesperadamente calar. Estive anestesiada muito tempo, onde os sonhos faziam sentido e não havia porque questioná-los. Agora, tudo o que acreditava tornou-se areia na mão.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008
Memórias de Infância I
Não, não é nenhuma mensagem subliminar... Cantava muito esta música mas não me lembrava de onde era: Rua Sésamo, claro está!!
sábado, 30 de agosto de 2008
Sódio
Pois. Seguiu-se um rol de explicações em voz alta (basicamente em tom de ameaça) que vou tentar resumir: a falta de sódio (entre outras coisas) é perigosa para epilépticos pois aumenta o risco de crises. E eu tinha tido um ataque dia 19.
“O cation sódio ( Na+ ) tem um papel fundamental no metabolismo celular como, por exemplo, na transmissão do impulso nervoso através do mecanismo bomba de sódio. Mantém o volume e a osmolaridade. Participa nas contracções musculares, no equilíbrio ácido-basico e na absorção de nutrientes pelas células.
Sua carência (pela alimentação, extremamente rara) nos humanos pode causar: anorexia, náuseas, depressão, tonturas, dores de cabeça, dificuldade de memorização, fraqueza muscular, perda de peso.” (Wikipédia)
Estou sempre a aprender, hein? Tomara muitos cinquentões ter este problema ehehe.
De facto, isto não tem piada nenhuma. (suspiro…) Estou ao computador com os óculos à meia hora e dói-me já a cabeça. Vou ver tv e comer um pacote de batatas fritas…
quinta-feira, 14 de agosto de 2008
Upgrade de Fotos III - Todas as fotos que tirei para pôr aqui e nunca coloquei

segunda-feira, 11 de agosto de 2008
Fresh Start
Sei que não é desculpa, mas não tenho net nas Caldas e é por isso que não tenho escrito para ti. Isso e o facto que ficar tão esgotada no dia-a-dia que quando estou na Marinha quero só dormir. Estou a reaprender a ser dona-de-casa (é verdade…) e a aprender como usar este corpo novo. Tenho algumas dificuldades quando tenho que lidar com uma coisa pela primeira vez (por ex., acender o fogão) mas assim que me apercebo de como me dá jeito fazer, faço-o rápido. Acho que demoro a fazer as coisas porque ainda estou numa fase de experimentação.
Tenho muitos problemas em adormecer, quando estou nas Caldas. Acho que me sinto sozinha lá, tenho dias em que não vejo ninguém. Agora Caldas é uma cidade vazia de história, para mim. É um sítio familiar mas oco, o que é bom quando se quer recomeçar pois não há ninguém que olha para ti de uma forma condescendente, por muito que as pessoas não queiram fazer isso. Mas neste momento aceito/ compreendo que as pessoas sejam condescendentes comigo. Ainda há pessoas que me viram uma vez depois do acidente e nunca mais me viram (oportunamente). Não quer dizer que não compreenda essas pessoas, e eu também não quero impressionar ninguém. Bom, mas não me apetece escrever sobre isso porque estou cansada e não quero afastar-me muito do tema. Mas a verdade é que as pessoas que me conhecerem só agora aceitam-me, como é óbvio, pois não conheceram a outra Daniela (por muito que queira, não sou a mesma, mas acho muito prematuro analisar os efeitos que o AVC teve no meu carácter, nem sequer se teve qualquer efeito.
Estou nas Caldas, estou a desenrascar-me bem, a noite é madrasta, ando cansada mas muito feliz. Eu já sabia que qualquer mudança é penosa, mas só quero agora viver um dia de cada vez e passear no parque. Passo sempre pelo parque quando vou para a terapia (vou sempre a pé). Sempre é melhor que o stress da nacional que liga a Marinha a Leiria. Ainda só comecei com a terapia ocupacional no (vê lá o luxo) Hospital Termal (que tem carpetes vermelhas nos corredores e é um edifício antiquíssimo) mas reacendeu a esperança de ficar (dita) normal. Sinto-me com outro fôlego e outro ânimo, e não sinto mais aquele tédio corrosivo que come a alma de uma pessoa de dentro para fora.
Ainda há muitas coisas a contar, mas estou mesmo cansada/ preguiçosa. Deixo-te com uma foto-testemunho de como me sinto agora:
Foto por Gustavo Santos
quarta-feira, 30 de julho de 2008
Como Conhecer a Mulher - Lição 1
Rapidinhas
"As mulheres adoram masturbar-se na banheira, apontando o jacto de água para o clitóris. Arranje companhia e torne o WC num SPA do sexo."
(OK, não sei se sou closed minded, mas isto parece-me altamente ridículo e só me apetece dizer WHAT THE FUCK?? Acho que conheço muito mal as mulheres. E sim, leio a Maria (como deves imaginar...) na casa de banho (ou WC, que é mais chique). Tinha que por esta no blog, desculpa lá... :D)
segunda-feira, 28 de julho de 2008
Insónia...
domingo, 27 de julho de 2008
Reflexão #246
Eu amava dançar, sair, beber, conduzir, viajar. Nada disso faço agora. Umas por medo, outras por complexo, outras porque não posso mesmo fazê-las. Pareço uma velha a lamentar-me quando ontem estive a “dançar”… Na festa do Pêro Neto (uma daquela terriolas perdidas na ainda mais perdida Marinha Grande). Eu gostava de ir a essas festas (cerveja barata, musica pimba e dar um passo de dança com a Rita eh eh) e foi a 1ª vez que fui a uma porque tinha de estar pronta para: 1º passo – Aguentar a música (sim, era má, mas refiro-me ao barulho em si); 2º passo – Arranjar sitio para me sentar; 3º passo – Tentar dançar. A certa altura disse à Rita “se te pisar, é porque não sinto”, ao que ela me respondeu “tu já me pisaste…”.
Hoje pensei outra vez em algo que me anda a martelar a cabeça. Sou a mesma, mas diferente. Falta-me coragem, não sei. Estou passiva, a Marinha faz mal à cabeça das pessoas, era como se vivesse numa ilha pequenina. Tenho demasiado tempo para pensar e pouca oportunidade para fazer. Quero fazer Teatro, é uma audácia arrogante e ingénua, mas é a verdade. Mas depois penso no que o Rogério me disse sobre os corpos acidentados na performance (que não se vêm muitos) e no que o Jonas me disse há uns meses (João Garcia Miguel, coordenador do curso de Teatro na ESAD) “podes sempre tirar um mestrado em encenação ou em dramaturgia”. Não. Eu não quero fazer outra coisa que não seja representar. Ás vezes tenho dúvidas, mas nestes momentos sei o que quero. Quero um corpo novo. Quero que desfaçam o mal que me fizeram. Estou pronta para esperar o tempo que for preciso, as dores que hão-de vir, os anos a passar, mas quero o meu corpo apto para dançar, representar. Ou então tenho que desenvolver um mecanismo que me permita fazer as duas coisas e que me faça sentir bem com elas.
Estou a olhar para o meu braço. Ele assusta-me. Sinto que ele se quer mexer (não consigo explicar melhor, mas é como se tivesses um braço engessado ou preso e ele quer-se soltar mas pode). Ao invés, ele está aqui pousado no meu colo.
quinta-feira, 24 de julho de 2008
Never Trust in Doctors
Ontem saí das Caldas completamente arrasada. “Ai e tal não temos T.O. aqui pois só temos 2 terapeutas e uma vai-se embora e a lista de espera é grande, podemos é pôr-te a fazer fisioterapia para que o choque não seja tão grande (tipo 15 tratamentos e um chuto no cú), e isto e aquilo e tudo e tudo e tudo, somos uns desgraçados, vou chorar aqui em cima do teu ombro se não tem importas, snif, obrigada, já me sinto melhor, já agora, não me pareces deficientes nenhuma, não vais recuperar mais, por isso não vale a pena darmos-te terapia porque vais ficar assim para sempre, seu Ser desprezível e inútil, nem serves para trabalhar nas televendas, e agora se não te importas, afasta essa canastro do meu gabinete.” (Não foi assim, mas eu gosto de dramatizar…) Saí dali a pensar que ia ficar outro ano parada à espera do Godot.
Fartei-me de chorar, a coitadinha que nunca tem nenhuma sorte na vida. Fui dormir e hoje acordei com os olhos inchados e muito mal-humorada. Preparei-me para ir para a terapia (em Leiria) e qual não foi a minha surpresa quando verifiquei que já não estava ninguém à minha espera, tinha as guias de tratamentos fechadas pois não tinha marcado nenhuma consulta ao fisiatra para renovar as guias. Parece-me que houve uma falha de comunicação qualquer, pois eu pensava que eram eles a marcar e afinal não. Marquei a consulta de fisiatra o mais próximo possível (dia 26… de Agosto!) e estava já a preparar-me para umas ferias forçadas. Quando chego a casa a minha mãe diz que o Hospital das Caldas tinha telefonado lá para casa e que a Terapia Ocupacional iria começar no dia 28 às 11h. Fiquei atónita; sem casa, sem tempo, desatei a telefonar para o meu pessoal das Caldas e lá arranjei onde ficar até ao fim do mês, mas tenho de arranjar um quarto para passar o mês de Agosto (conheces alguém que me possa ajudar?). Não tenho certezas de nada, podem-me mandar embora ao fim de 15 ou 20 tratamentos. Mas isso é outro stress com que me tenho de preocupar mais tarde.
Estou tão atarantada que ainda nem tive tempo de sentir medo. That’s this, I’m going to live alone, like I was eighteen again. Wish me luck!
terça-feira, 22 de julho de 2008
Reflexões #245 e Troca o Passo
Tenho que falar do que aconteceu na residência. Ainda não digeri muito bem o que isto significou para mim, mas também não faço o esforço. Foi o que simplesmente foi, quero gozar este sentimento de liberdade, pois para mim o Dogma permitiu-me ser livre, mas como outra coisa qualquer. Quando vivemos numa prisão (física, refiro-me) tudo o que acontece é um desafio, e estás sempre a testar os teus limites, sempre para voares o mais possível. Senti-me tão bem naquele palco, como se pertencesse lá (isto é uma coisa arrogante de se dizer?), não como artista ou actriz ou performar ou outra coisa qualquer, também porque eu não sou nenhumas dessas coisas, sou a Daniela ou a Né. E a Né sempre precisou dos outros, como num estado de dependência estúpida, eu preciso mais do público do que eles de mim. Digo-te isto com todo o meu coração, pois é a minha verdade, e não me interessa debater o “porquê”. Passei muito tempo a pensar. Quero fazer coisas do coração e não da cabeça. Se me apetecer despir em palco, faço-o, e não me interessa se é gratuito ou não, simplesmente é. Todas as coisas acontecem por um motivo, logo nada é gratuito.
Mas não sei se quero palco, não sei mais nada do eu este momento em que estou a escrever para ti. Não sei qual será o meu futuro, mas não tenho pressa. Tenho que me explicar melhor noutra altura. Hoje não. Amanha vou dar um passo à frente de todos os que dei para trás.
sexta-feira, 18 de julho de 2008
Como Foder um Ensaio (em 3 passos)
- Deitar-se no chão em pânico e dizer "Vou ter um!!!", pedir para apagar as luzes e pedir um comprimido
- Não ter controlo no corpo durante um tempo
- Começar a tremer desalmadamente e dizer "Já passou..."
(Este processo deve demorar cerca de 30 minutos)
Et Voilà!!
(Ai a puta da minha sorte...)
terça-feira, 15 de julho de 2008
segunda-feira, 14 de julho de 2008
Rogério Made Me Do This! 2
- estar sozinha
- fazer o calor na TO
- acariciar animais
- passar pela Ponte Nova (pinhal denso onde a estrada está coberta por arvores)
- estar na praia
- viajar de comboio
- estar com o Gustavo
- acordar com o sol
- comer marisco ou ir a um restaurante e a comida ser mesmo boa
- ouvir musica
- tirar fotografias
- ver sitios novos ou olhar para os velhos outra vez
- sentir-me desejada
- abraços (de toda a gente)
- ficar na preguiça na cama quando acordo
- ver a minha gata a fazer maluqueiras
- ir ás compras (menos c a minha mae)
- dar presentes inesperados
- ver fotos antigas
- que me tratem como se nao tivesse problema nenhum
- vozes graves (tipo Tom Waits)
- ouvir o aspirador ou o secador quando estou quase a adormecer
- ver o por do sol
- dormir
- ver montras de angencias de viagens
- ver mapas, voos, dos paises que quero visitar
- estar numa esplanada com pouca gente
(Isto é tudo mentira)
Rogério Made Me Do This!
Um AVC.
Quem?
A mim.
Quando?
Dia 19 de Junho de 2007.
Onde?
Nas Caldas da Rainha.
Porquê?
Devido a uma malformação .
Como?
Estava a fazer um trabalho com uma amiga, de repente comecei a sentir-me mal, caí, deixei de conseguir falar, fui para o Hospital e entrei em coma. Acordei 12 dias depois e no dia 10 ou 11 de Julho fui operada para corrigir essa malformação.
Day 3
domingo, 13 de julho de 2008
Dia 2 - Masturbação mental frustrada
11-07-08
(Organizar o pensamento é difícil, cada vez me apercebo mais disso.)
Tomamos o pequeno-almoço juntos e esse é, para mim, o verdadeiro momento de preparação do trabalho que vamos fazer. Surgem conversas estonâneas sobre tudo, mas invariavelmente acabamos por falar no trabalho, abordamos o Dogma e os nossos projectos e as nossas preocupações com isso. Pessoalmente, na parte das preocupações, eu não participo. Não tenho tantas dúvidas como os meus colegas porque - já tinha um pouco essa noção, mas agora tenho a certeza - acho que ainda não recuperei a minha capacidade crítica (nem sei se vou alguma vez recuperar, não sei de nada para além deste momento em que estou aqui). Compreendo o que eles dizem, mas para mim não se passa o mesmo porque aceito tudo. Estou muito perdida, ou então estou a simplificar - a minha cabeça está em delay, e precisa de simplificar tudo. Não sei se isto é bom ou mau, corro o risco de fazer um trabalho muito naif, mas por outro lado não corro o risco de complicar as coisas e fazer algo que não seja facilmente compreensivel. Eu quero que o público me preceba, todo o tipo de público, e não só uma elite.
Depois do pequeno almoço, o Alexandre apresentou ou seu projecto, "Vou a tua casa e não estás".
A tarde foi um pouco mais dura para mim. Comecei a perguntar aos meus amigos por MSN "O que é o Tempo?" e obtive algumas respostas interessantes, especialmente com uma amiga minha, Raquel Monteiro. Ela respondeu-me "vida". Abrodamos a questão da existência e da vida - se podia haver existência sem haver necessariamente uma vida (por ex., uma pedra existe e não tem vida) - a crença entre outras coisas. Foi deveras interessante ter uma conversa assim, pois esses pensamentos para mim não passavam de monólogos. Gravei a conversa para te dar a ler, mas a vida tem coisas do caralho, e o meu PC, que é um VAIO XPTO, com o Vista cheio de paneleirices, que comprei em Fevereiro por cerca de 1500€ não arrancava. Putz. Tive de o formatar para ter pc para o outro dia... (Desabafo...)
Vida/ Existência
Então vou só escrever as coisas que tirei para mim, coisas que me lembro. O tempo é a existência e não necessáriamente a vida. A vida é a medida do Homem, o que ele consegue compreender, porque a existência é algo que não é comensurável. Vida = medida do Homem, Existência = modida do Universo. Para o Homem, o tempo é a vida, para o Universo o tempo é a existência. Para combater o receio da morte, existem crenças, religiões, mas o Homem não consegue entender que a vida não acaba, só a morte existe. Há sempre vida no Mundo, quem nós estejamos vivos ou não. A morte é algo que o Universo percisa que haja, para uma expansão do próprio Universo. É difícil fazer o Homem compreender que a vida exista para além dele mesmo, mas se algum dia deixar de existir qualquer tipo de vida no planeta, ainda existe a propria Existência. Só quando o próprio Universo deixar de existir é que deixa de haver Existência.
Eternidade
A Eternidade existe quando alguém vivo e racional toma conhecimento que aquela pessoa existiu (por ex., um escritor, ou umas ossadas de outras civilização). A Eternidade não é para o sujeito que viveu, mas para o sujeito que nesse momento toma conhecimento da existência de alguém. O sujeito tem conhecimento da Eternidade como conceito, mas como objecto ela não existe, ou seja, a Eternidade tal como nós a entendemos, não existe. A Eternidade é algo que o Homem inventou para não sentir medo da morte, e até sentir conforto na morte.
Crença
A Eternidade está completamente ligada à Crença, seja ela religiosa ou não. Uma pessoa que crê em qualquer coisa (seja no destino, seja no passado) acredita em coisas que não sabe. Comprovam-nos coisas (como a Terra ser redonda) mas o que existe é só o que estamos a ver naquele preciso momento (por ex., eu estou no quarto e ouço as pessoas a falar, mas não as vejo logo não existem). Todo o Ser Humano crê, porque sabe que é verdade e não tem dúvidas disso, tanto faz acreditar numa realidade ou numa ficção (pois para essa pessoa as duas são reais).
Tempo
Então descobri que à minha pergunta "O que é o Tempo?" a resposta já está incluida, o Tempo é um ciclo tão simples, é fim da Existência", ou o fim do próprio Tempo. Lembrei-me agora de um trava-línguas que aprendi na escola e é a verdade:
"O Tempo perguntou ao Tempo quanto tempo o Tempo tem, o Tempo respondeu ao Tempo que o Tempo tem o tempo que o Tempo tem."
Foda-se é tão simples quanto isso!
À noite estivemos a fazer um brainstorming em grupo sobre cada um dos projectos (e o Tempo andava a martelar-me a puta da cabeça...)
Resumo do 2º e 3º dias
11-07-08
Dia da masturbação mental.
Day 3
12-07-08
Dia de actualizar o PC filho da puta e começar a organizar pensamento.
(Nota: Serei mais exaustiva assim que o Mestre Curador me der TEMPO!!!!)
sábado, 12 de julho de 2008
Explain My Project in One Single Sentence
sexta-feira, 11 de julho de 2008
Comentario de Gustavo Santos
11 de Julho de 2008 15:08
Holden - Ce Que Je Suis
J'ai bien le droit
j'ai bien le droit aussi
de faillir, défaillir
jusqu'à mesurer le prix
mais qu'est ce qu'il m'arrive
je ris aux larmes
je larmorie
mais qu'est ce qu'il m'arrive
je dors au bord de mon lit
oh comme je regrette
je ne suis pas ce que je suis
les murs ont des oreilles
les murs parlent trop
oh comme je déteste
je ne suis pas ce que je suis
la lune qui me surveille
la lune est dans mon dos
j'ai bien le droit aussi
de railler, dérailler
épuiser toutes mes envies
mais qu'est ce qu'il m'arrive
j'oublie, je bois,
je bois l'oubli
mais qu'est ce qu'il m'arrive
je dors au bord de mon lit
oh comme je regrette
je ne suis pas ce que je suis
les murs ont des oreilles
les murs parlent trop
oh comme je déteste
je ne suis pas ce que je suis
la lune qui me surveille
la lune est dans mon dos
j'ai bien le droit aussi
de conduire, d'éconduire
les hommes au bout de la nuit
oh comme je regrette
je ne suis pas ce que je suis
les murs ont des oreilles
les murs parlent trop
oh comme je déteste
je ne suis pas ce que je suis
la lune qui me surveille
la lune est dans mon dos
(Sugestão da Espectadora Especial Leonor)
"Too Real to Belive..."
10-07-08
Não sei se sabes ou não, mas este blog tem um motivo de existência, – lembras-te de ter falado na Oportunidade do Espectador (orientado por Rogério Nuno Costa, seguindo as regras do Dogma’05)? – é um projecto. Eu não gosto de repetir coisas que já estão escritas, clica nos nomes para ficares a par do que é este projecto.
Vim para Lisboa no dia 9, e fui apresentada a duas colegas que já cá estavam, a Katinka e a Katja, de Berlim. Os outros participantes, o Hugo e o Alexandre (que também não conheço pessoalmente) chegam esta semana. Só no domingo é que estamos todos juntos.
Ontem de manhã o Rogério esteve a falar do que era o Dogma’05 e o que era. Já tinha lido sobre essas regras, mas assim tivemos a oportunidade de esclarecer alguns pontos e dúvidas. O dia foi dedicado a brainstormings e apresentações dos projectos. Eu não sabia o que ia fazer. Senti-me perdida e confusa, a nadar num mar de experiencias e sentimentos, e não conseguia sequer pensar. Tirava apontamentos só para não me esquecer das coisas, e não para reflectir nelas. Discutiu-se tanta coisa que tinha a impressão de não ter apanhado nada.
E eis que surge uma ideia, hoje de manhã ao acordar, e anotei no telemóvel o seguinte:
“O universo da espera, do tempo, da paciência – suspensão da vida, pausa – a dimensão do tempo. O sentimento de impotência, frustração e a conformidade.”
Consegues perceber? É agora que preciso mesmo de ajuda para organizar esta cabeça.
terça-feira, 8 de julho de 2008
A minha voz antes do AVC II
Confesso que estou com alguma vergonha. Mas também, a minha voz agora está mais para o lado do Tom Waits, o que tenho a perder? Mas não sejas muito cruel... É que eu nunca cantei a sério em frente de ninguém para além da minha professora de Voz, e mesmo assim foi muito dificil...
segunda-feira, 7 de julho de 2008
Borboleta
No meu castelo via todos os montes silvestres, as árvores e os jardins floridos que o rodeavam. Haviam também Homens, eu sabia que eram Homens pois eram parecidos comigo; os livros da biblioteca diziam o mesmo, mas não me sentia um Homem. Também existem os Pássaros, mas isso não quer dizer que uma andorinha fosse igual a um melro. Sentia-me só Eu. E nada mais importava para além disso tudo. Tudo era tão simples de entender, tão fácil de desfrutar! Todas as coisas eram sempre novas aos meus olhos, e tirava prazer disso, até porque o melro de ontem não era igual ao melro de hoje. Movimentavam-se de forma diferente, bicavam de outro modo, portanto nunca tinha tempo de pensar. Só de descobrir.
Numa tarde de Verão, em que a chuva me tocava através das conversadeiras e as andorinhas faziam voos rasantes ao castelo, comecei a pensar. E se eu fizesse o mesmo? Se eu pudesse voar como as andorinhas e gozar a chuva de uma maneira que nunca tinha experimentado?
Foi a minha primeira questão. E depois seguiram-se muitas outras, umas atrás das outras “porque não tenho asas?”, “porque não sou uma andorinha?” ou “o que estou a fazer?”. Estava a pensar. E, de repente, tudo o que contemplava deixou de ter importância para mim, e comecei a passar os dias trancada na biblioteca a fazer estudos sobre os animais, depois sobre o Homem, posteriormente sobre psicologia, até estudei filosofia, e nenhum desses meus estudos foram proveitosos. Quando finalmente dei por acabados os meus estudos, já tinham passados muitas primaveras sem observar nada para além das letras escritas nos papéis amarelos de velho, como o meu castelo.
Quando saí da biblioteca pela primeira vez, houve qualquer coisa em mim que estremeceu; o castelo já não era amarelo, mas sim cinzento. As conversadeiras estavam gastas do vento e dos anos, e apercebi-me do Tempo. Já não contava as primaveras, mas sim os anos que já pesavam sobre mim. Toquei no meu rosto e apercebi-me que não era mais aquela pele macia e branca, mas cortiça emoldurada por uns cabelos brancos muito fininhos e frágeis. Afinal tinham passados muitos anos, séculos. Sabia tudo o que estava escrito nos livros, mas tinha chegado à conclusão que não havia resposta nenhuma para a minha pergunta. Foi a primeira vez que me senti triste. Outro novo sentimento me alvoraçou; subi à torre de menagem com a dificuldade de quem suporta séculos na alma, a passos lentos, e cada passada o meu coração ficava mais apertado. Quando por fim cheguei ao topo, vi qualquer coisa de medonho. Dei três passos para trás e caí, mas sabia que tinha que sair daquela visão, e desci. Desci numa fúria em câmara lenta, como se estivesse a ser apunhalada nas costas mil vezes de cada vez, numa tortura perversa de quem tem prazer em fazer sofrer. Meio atordoada, sentei-me nas ruínas da capela; eu nunca soube para que esse edifício servia, mas sentia-me reconfortada nele. Esperava eu que aquele sítio tão vistoso e tão belo me trouxesse algum tipo de paz, mas pelo contrário; sentir raiva por ter desperdiçado séculos a ler em busca de uma resposta, e agora velha como aquele sítio que não era mais o meu castelo, senti a cabeça a arder e os olhos inchados, porque tinha estado a chorar. As lágrimas caiam copiosamente na minha cara de velha, e espalhavam-se nas minhas rugas, para que entrassem de novo na minha pele. Senti derrota, e subi de novo para as conversadeiras.
Sentei-me lá, a pensar incessantemente no “e se…?” e no que tinha visto na torre de menagem: o meu castelo, outrora rodeado de montes silvestres, arvores e jardins floridos, estava agora rodeado de casas estranhas, onde viviam Homens e me invadiam o meu espaço. “E se eu pudesse voar para longe daqui, fora do Espaço e do Tempo?” Fiquei a reflectir algum tempo nessa pergunta, até que adormeci. Não sei quantas horas ou anos, mas quando acordei não pensei; estava um dia maravilhoso, com um Sol radiante, que enchia o meu castelo de cor. As andorinhas estavam felizes, e eu também me senti feliz por vê-las tão alegres. Uma delas pousou junto a mim e pude ver os olhos dela, negros, profundos, e cheios de estórias para contar. E ficamos as duas, em silêncio, a escutarmos a respiração uma da outra, até não precisar de mais nenhum sentido que não a audição. Deixei de ouvir os carros a passar, o vento a soprar. Só ouvia o coraçãozinho dela a bater rápido e o meu a ficar cada vez mais acelerado, até se tornar igual ao dela. Por fim abri os olhos, e ela estava a olhar para mim. Ela levantou voo, e eu não pensei mais e fui atrás dela, e atirei-me.
Por um segundo pensei nas borboletas que vivem só um dia, para encantar os olhos dos outros com a sua beleza. Quando abri os olhos estava pronta para morrer, mas algo aconteceu de inexplicável; eu estava a voar junto daquela andorinha, e era igual a ela. Olhei para mim, com as minhas asas negras e segui-a, com os ventos do sul.