Submissão

Chiu!... Esconde as lágrimas!
Soldado que é soldado não chora! (E homem também não…)
Ergue-te! Não deixes que te vejam cair,
Queres cair, fá-lo sozinho, e esconde a cara
Da vergonha. Corta-te para ninguém ver os teus olhos inchados
De tanto chorar.

(E a mãe do rapazinho suplica por clemência,
Está ali, aos gritos, como se lhe arrancassem as unhas
Uma por uma,
Dez dedos dos pés,
Dez dedos das mãos,
“Matem-me, mas poupem o meu filho!!”
Guincha tanto de dor que mais parece um porco na matança)

Cala-te! Não és tu que serves, não és tu que tens de provar
Este sabor, este cheiro, esta visão da morte,
Não és tu que vergaste tanta dor.
A tua divida está saldada.

(“Porquê? Porquê?? Porque esta injustiça comigo,
Eu que sempre dei tudo,
Que suportei tudo,
Que levei porrada da vida,
Deixa o meu filho e leva-me a mim!”
E nesta altura já a mãe estava no chão,
A esvaziar-se em sangue pelo destino.)

O soldado (que mais parecia de borracha do que um ser humano),
Foi agarrado por mil mãos invisíveis,
Cada uma delas a segurar cada osso, tendão, poros da pele
Que se transformavam em comida mastigava por mil bocas.

O pequeno soldado não existia mais.
A mãe não se quis crer e enlouqueceu.

Um dia, com barba feita, o solado disse-me
“Tenho 17 anos e vivi 40. Não sei quantos mais ainda me restam,
Mas o que restar foi goza-los com uma mulher.”
Afastou-se, rindo que nem um louco
Com as suas pernas raquíticas e com uma erecção.

o4-04-08

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