Pausa para Estar
Estes últimos meses têm sido de um muito. Muita liberdade, muito trabalho, muita burocracia, muitas primeiras vezes, muito estudo. Olhar para a frente a estudar terreno antes de pôr o pé. Uma segunda adolescência consciente. Este é o ano que atingirei a maioridade nesta outra vida. Daqui a poucos dias faço 39.
39. Não faz sentido.
Se, por um lado, tenho gozado de uma imensa liberdade e curiosidade genuína do outro me conheceram no meu todo (e todos os que fui conhecido e revendo), com espaço para aceitação e limites, num compromisso mútuo de respeito, a volta a Portugal tem um sabor agridoce.
A meio do processo de mudanças, com todo o que isso implica, houve desde inicio uma quase total desvalorização da informação que trazia, durante o processo todo, que continua. A meio do trabalho de Lisboa tive que organizar tudo e delegar, a pedido, possíveis coisas que poderm ser feitas enquanto estivesse em residência. Nota: Não obriguei ninguém a fazer nada que não quisessem e deixei claro que poderiam parar sempre que quisessem, com a noção que a minha palavra teria que ser respeitada, não obstante possíveis compromissos.
Verifiquei desde início uma enorme resistência em respeitar as minhas decisões estética, as minhas decisões de empresas a contratar, um carnaval do "eu sinto-me mais confiante no fulano A" e "não vais meter essa cor, pois não?".
Vou, e se tiver alguma dúvida peço opinião, não quero leva-las nas trombas constantemente como um peixe morto.
Creio que não compreendem que tenho uma imagem na cabeça, que creem que não sei do que falo e que estou a tirar ideias do cú só para fazer pirraça. A questão é mesmo esta, "não sei do que falo", e nem à luz de repetidas demonstrações que sei, de facto, do que falo, só sinto descredito. É como empurrar uma parede.
E hoje foi outro dia dor de cabeça. Dor de cabeça porque não "precisavam do GPS". Porque "isto não é nada de jeito", porque A, B, e C, mas ah! afinal funciona porque o técnico disse. Porque quando sou eu a dizer "não sei do que falo".
Às tantas já me aprecebi que não é só porque eu sou isto e aquilo, é porque me comecei a recusar a deixar que a minha palavra seja pisada (e a culpa disso ter acontecido foi minha). Então é uma batalha constante para que os outros me vejam nos olhos. A discriminação têm muitas cores, e é normal que nem nos aprecebemos que o estamos a ser. "Para ajudar" é muito parecido com "para controlar" e estou a perder a sensibilidade quando não me ouvem, fazem preguntas e não gostam da resposta. Perguntei "queres que minta?" e a resposta foi uma porta fechada. Não sei se a minha praticalidade me torna insensível e juro que não foi à falta de explicações e pedidos. Às vezes sinto que carrego uma casa às costas, a monitorizar as emoções, a encorajar comunicação. No fundo, que também tenha uma palavra a dizer sobre a minha vida, talvez por isso prefira ir para fora periodicamente - também eu preciso de respirar.
Tomei um brufen para ver que conseguia terminar o dia. Para acabar, um pedido de orçamento que vi quase de imediato que me estavam a tentar foder (e estavam, fiz as contas) com imprecisões quanto aos custos e pedidos de fé. Não amigo. "Mas eu conheço o senhor" e eu estou-me a cagar. Não se dirigiu a mim nunca, mantendo-me à parte "das conversas de adultos". Lembro-me do olhar de desdém do homem ao cumprimentar os meus pais nem a mão estendeu para mim. A discussão que se seguiu quando fiz as contas e disse que não queria contratar os serviços do homem. Da chuva de palavras "lá estás tu", "o senhor não vez por mal" e o inferno está cheio de boas intenções. Quando testemunhado o repetido tratamento daquele homem disseram-me que estava a exagerar mas que "o homem foi estúpido foi". E então perguntei porque é que não se tinham pronunciado quando assistiram. "O que querias que fizesse?" - alguma coisa que não a legitimidade duma conduta discriminatória. E aí cai o carmo e a trindade, e volta a dança do vitimismo. Estou demasiado cansada para entreter estas narrativas que começam por "E eu". E eu, que vivi e vivo isto tudo todos os dias? E isto tudo é a minha vida, este corpo, estas dores, este cérebro, não me queixo (muito), e tento seguir a arrastar a casa. Apetece-me larga-la e ir recolher-me, perder-me em mim, fazer, contruir, só pelo prazer do processo, cuidar de mim que já é bastante, sarar de 6 meses de completa insanidade, organizar os pensamentos e experiências. Há muito ruído, sempre muito ruído - preciso de uma pausa para estar, já que aqui não tenho pausa para ser.
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