"É só cabeça!"
Olá de novo, consegui (precisei) de passar aqui de novo.
Não sei que dia é. Já vão algumas semanas de luta para estar acordada de dia. Vou às compras de manhã porque ainda estou acordada. Compro como se me estivesse a preparar para o fim dos tempos porque não sei quando voltarei a estar acordada (ou operacional) a horas úteis (para quem?). Tenho dormido imensas horas, pelo dia inteiro. Tenho tido sonhos totalmente absurdos e alarmantes - são muitas as vezes que acordo dum sonho em pânico. Pensei que talvez seja um efeito do desmame, ou do stress. Talvez mesmo dum esgotamento sei lá, na verdade nem curiosidade tenho para saber.
Estava aqui a pensar que daria tudo para ter uma vida normal, 9 às 5, parceiro a talvez umas crianças. Que as minhas preocupações se assemelhassem às preocupações dos meus pares, que elas fossem partilhadas naturalmente por sociabilidade.
A minha vida não foi uma opção minha, é apenas um conjunto de adaptações às circunstâncias e, infelizmente, com muito mais positivismo que realidade (I'm aware still I believe).
Pensei também que mesmo que desista, a vida não será mais fácil. No desespero das infindáveis dores de cabeça vi a opção de sair e serenei. Dói para caralho amar e dizer não. Estar tão sem chão que uma reunião se torna numa sessão. Magoo a minha mãe, o que me rasga o peito, e não há muita alternativa - ela esgama-me com preocupações criadas pelos receios dela, e não tenho como provar que, apesar de tudo, também eu sou uma pessoa inteira, mesmo que ela acredite que não. Pior que tudo é este cansaço de estar a segurar a porta para ela não se abrir a todos os minutos de todos os dias, porque se me desleixo e a deixo abrir, arrisco-me a ser albardoada e pisada com a gana que têm de entrar. E sim dói saber que a minha rede de apoio é capacitista, sem muita margem para compreensão de outros modos de vida. Dói porque os amo e não estou a conseguir aguentar.
Daí não é de admirar que não consiga pedir apoio, sendo que me foi dado com condições, e isto alarga-se na maior parte das interacção que tenho tido pós avc.
Sou demasiado. Carrego demasiado. Ninguém quer levar com isso durante muito tempo (e está tudo bem). Nem eu aguento. O buraco é mais em baixo do que parece e nem mau é.
Envergonho-me de tanto queixume também. Não sei para onde me virar, na verdade ainda não tenho forças para tal. Paciência é virtude, estranho ter que experiencia-la comigo própria (faz-me sentir culpada). Desculpem estar tão dentro de mim, é exaustivo desatar um nó para ter que voltar atrás 10 linhas e a linha se partir.
E, de pano de fundo, o colapso dum sistema. E sei, que neste vagão, os direitos conseguidos (vulgos privilégios) vão ser retirados por uma desculpa qualquer. Um desencanto, choque na verdade, como há quem tenha tesão por achar que estão acima dos outros (também eles serão comidos - a fome deles é grande mas não maior dos que se escondem em nomes de família).
Engraçado (trágico) que estes sejam parte das minhas ruminacões diárias. É muita luta e desespero (e solidão). Desta não me parece que me livre. Talvez a resolução para isto tudo seja a linha da frente, com um cocktail na mão (a dormência também atinge o medo) - com a sorte que tenho a revolução dá-se e eu fico a saber uma semana depois.
--- tive que desenhar um dos meus últimos sonhos ---
Sonho com alguém que conheço, pessoa que está a lutar contra um cancro. No sonho ela tinha sido costurada a um corpo de plástico, e estava a discutir com alguém ao meu lado. No sonho só mirava as costuras que seguraram a cabeça ao corpo.
Não é de admirar que só aquelas duas frases me ficassem registadas (que fosse só corpo, que fosse só corpo).
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