Bastidores

Vi-o e comecei a pensar em como as pessoas olham para mim. Ouvi-o e pensei nesta voz que tenho agora. Detectei todos os sinais que também tenho. Olhei para ele, vestido de palhaço, e pensei: “eu não me conheço”. A cabeça não acompanha o meu corpo, não sei o que realmente posso fazer, o que posso fisicamente usar. Pensei “devia ir a umas aulas do 1º ano”, depois pensei “acho que não me ia sentir à vontade, devia começar sozinha”. Finalmente caí em mim “eu nem saio de casa, quanto mais ir à escola”…

Quando vim para as Caldas quase que nem conseguia ir para a terapia. Para ir ás comprar tinha de ir de autocarro. Depois comecei a fartar-me de esperar pelo autocarro que nunca vinha a horas, e passei a ir a pé, primeiro com sacos leves, depois com tantos que tinha que usar a mão direita para me ajudar. Aos poucos, sem dar por isso, andava mais do que andava na escola. Mas o Outono veio manso e o Inverno chegou a rasgar e arrasou com tudo, marcha, sensibilidade, músculos. Deixou-me com os músculos tão contraídos que nem consigo andar mais ou menos. Arrasto a perna, anca perdida, braço pêndulo… Isto, claro está, acontece quando tenho os membros frios, o que ocorre quase sempre. Remédio? Ficar na cama. Eternidades na cama. Só à espera… No fundo, à espera que o tempo passe para que veja o resultado final, não sei, mas lá no fundinho só quero sentir-me livre. Por isso tenho de ver o meu corpo em movimento, num espelho ou numa gravação…

Porra, e esperar.

Eu gosto da minha voz assim. O meu novo corpo libertou-me de uma série de preconceitos. Entre os quais, a perfeição. Aprendi a ter calma, e a esperar. Nem tudo é mau, nisto. E quando olhei para o Miguel Seabra vi um palhaço. No meio de tantos actores clown, pródigos em teatro físico, vi um palhaço que usava todo o corpo para falar. Ouvi pessoas atrás de mim “ele está a representar ou é mesmo assim?” e congratulei-me por o ver naquele palco, a fazer o que sempre quis, e a fazê-lo bem.

No final, fiquei um pouco. Vi os técnicos a desmontar o cenário. Lembrei-me dos ensinamentos do Daniel, que foi da minha turma e era exímio nas questões técnicas. Apeteceu-me saltar para o palco e ajudá-los a enrolar cabos e a arrumar os adereços. Senti que pertencia ali. Não no palco, mas nos bastidores. Não sei representar, ou já não quero representar. Os meus amigos dizem que estou em negação mas desde o início, quando decidi estudar teatro, que digo que fico sempre feliz dentro de um teatro, nem que seja a varrer o palco. E digo a verdade, só que nunca tinha pensado nisto.

Comentários

joão caridade disse…
tás mesmo com cara de quem é dos prédios da !!CAIXA!!
caralho.
não enganas ninguém.
(...mensagem bruta)_______________________________________


(mensagem querida...)
1bj no cú e na unha
echoes disse…
gosto mesmo de te ler!:)
Damour Pourtoi disse…
João Dioguinho:
Para quem é do camarnal e foi viver para um país do 3º mundo (vendem tabaco a vulso?) tens-te em muito boa conta. Será dos lencinhos que usas ao pescoço?
(...mensagem bruta)_________________


(mensagem querida...)
Até te posso dar um beijo na unha, mas no cu não.
(Seu porcalhão, vens para aqui troçar das minhas fotos. Quando te apanhar vou-te dar porrada, olha que eu sou do bairro e conheço o Totta!!!)



Pandora:
É bom saber que alguém REALMENTE me lê!! :D


--- Bem-vindo Nuno, ao Re-Cobro! ---
nuno medon disse…
Olá! E tu vais chegar onde queres e sentir o teu corpo livre. O Inverno é tramado para toda a gente, não é só para ti! Venha o calor e melhores dias para ti! beijos e um abraço. Força Daniela!
Damour Pourtoi disse…
Obrigada Nuno pela força que me dás*
nuno medon disse…
Não tens nada que agradecer! Porquê a mudança de Daniela para Saltinbanco? beijos
Damour Pourtoi disse…
Porque estou sempre a imaginar-me assim.

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