Em trânsito (Lisboa)

Lisboa, fim de tarde. O autocarro não está cheio e chove lá fora. O mesmo caminho de 20 anos. Mochila feita, parece que nada mudou muito apesar do mundo ter mudado muito. Como é possível que já tenham passados 20 anos? 

Parece que estou a chegar perto do ponto em que parti, não como num circuito fechado mas como pi. De súbito tenho dificuldades em encaixar todos os meus compromissos. Estou assustada, excitada, apreensiva, preocupada. É sempre assim, muito tudo. Estou em paz com a decisão de me ser fiel e ao sê-lo afugento pessoas. Outras ficam bem próximo, mesmo na distância. 

Ontem ao falar com a Anita aprecebi-me que estava a enconar e não sabia porquê. Encono muito mesmo e ao desligar o telefone pensei nisso. Ao telefone com a minha mãe, mais tarde, a enconar estava. Finalmente fez-se luz "mãe, eu consigo orientar-me sozinha mas é muito". Não consegui pôr em palavras. "Queres que vá aí para te ajudar?"

Sim. Obrigada mãe.

Subitamente senti um peso a sair-me das costas, a ansiedade.

"Oh Né, tu tens que me dizer se precisas de ajuda ou não, não quero que tu sintas que estou a fazer as coisas que tu não queres que faça".

Caralho. "Tens razão mãe. Desculpa não sei como pedir ajuda, mas vou ver se desencono".

"Não sejas orgulhosa, é simples".

"Não é isso. É que me sinto sempre um estorvo"

(...)

Lembrei-me da observação de um quase estranho lá na cozinha exterior a quase 4mil quilómetros daqui "you can't ask for help, right?"... "I guess not. Never had thought about that". Gostava de me observar como faço com os outros. Estranha variação de percepção, uma vida a pensar que o normal não o é.

Lisboa. Cheguei.



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